quarta-feira, 11 de maio de 2011

A vida nos asilos: o peso do envelhecimento

No Lar dos Idosos, o tempo passa devagar./Foto: Marciane Hences.
O envelhecimento da população e o aumento da longevidade de pessoas com capacidades física, cognitiva e mental reduzidas requerem cuidados especiais, e ai entra o papel dos asilos, que acabam funcionando como assistentes sociais

Os asilos existem há muitos anos, porém, o crescente aumento do número de idosos nos asilos é uma conseqüência da sociedade contemporânea, onde a beleza e a juventude são super valorizadas, já a velhice é associada às doenças. Os asilos recebem principalmente pessoas com distúrbios psíquicos ou deficiência mental, já que não existe nenhum outro serviço de saúde ou de assistência social para essas pessoas, que precisam de cuidados especiais.
Outro fator que leva os idosos aos asilos é relacionado ao aumento na expectativa de vida. Segundo dados do censo 2010, realizado pelo Instituto de Geografia e Estatística (IBGE) a expectativa de vida da população brasileira subiu para 73 anos, 2 meses e 1 dia, na comparação com 1980, o brasileiro ganhou mais 10 anos, 7 meses e 6 dias.
Entretanto, o Brasil não está preparado para os problemas decorrentes do envelhecimento. Devido à falta de programas destinados à velhice e a precariedade da rede de Assistência Social, todos os problemas que a comunidade não consegue resolver são encaminhados aos asilos. O envelhecimento da população e o aumento da longevidade de pessoas com capacidades física, cognitiva e mental reduzidas requerem cuidados especiais, e ai entra o papel dos asilos, que acabam funcionando como assistentes sociais.

Asilo Lar dos Idosos
O Asilo Lar dos Idosos de Frederico Westphalen foi fundado no ano de 1983 e possui hoje 56 idosos, a maioria com idade entre setenta e oitenta anos de idade. O asilo lhes proporciona abrigo, alimentação, recreação e encaminhamento para cuidados médico-hospitalares, quando necessários.

O abandono
Dona Odila Maria Pazuch, 78 anos de idade, natural de Osvaldo Cruz, foi levada até o asilo pelo tio. Ela conta que já foi casada, porém, não teve filhos, trabalhava na roça e morava com parentes, quando ficou doente e não pode mais ajudar na lavoura, a família achou melhor encaminhá-la até o asilo. Ela sofre da doença chamada osteoporose, e só consegue andar apoiada em muletas. No início ela pensou que ficaria apenas por um tempo, se tratando da doença, como foi informada pelos familiares, porém o tempo foi passando e ela nunca mais recebeu a visita de ninguém. Em março fará 09 anos que ela mora no asilo.
O que mais incomoda Dona Odila é o fato dela não poder ajudar nas tarefas diárias. Angustiada, ela conta que sente muita saudade da vida que tinha na roça, do trabalho na lavoura, todos os dias lembra de lá e que sonha em um dia poder voltar a morar na sua antiga casa, onde era muito feliz. (Foto D. Odila)
Já Dona Maria Bueno, de 66 anos de idade, natural de Rio Grande, morava com a filha e o genro em Alto Alegre e também trabalhava na roça. Porém, depois de certo tempo de convivência, não conseguiu mais se acertar com o genro. Ela diz que não vê a filha há três anos já, que foi a última vez que ela veio lhe visitar. ''Qualquer dia eu fujo daqui e vou morar nem que seja numa árvore'', comenta Maria Bueno,o olhar triste, de quem perdeu a esperança num futuro melhor.
Os velhinhos do Lar dos Idosos quase não recebem visitas. A instituição é aberta diariamente para visitação, porém, poucos familiares aparecem. Alguns abandonam ali os pais ou parentes e nunca mais voltam. Eles disfarçam e tentam demonstrar que não se importam, mas é perceptível a tristeza e o vazio no olhar perdido, descrentes da vida e do futuro que lhes aguarda.
Algumas instituições os visitam, por exemplo, nos sábados a tarde vem um grupo de oração, algumas escolas, grupos do Serviço Social do Comércio (Sesc), o Lions Clube do Município, os Vicentinos, algumas empresas como a Bakof, entre outros que também ajudam com doações. Além disso, uma parcela deles recebem visitas dos familiares, alguns tem parentes que moram em outros estados e ligam para saber como eles estão.

A demência
A maioria das pessoas que residem no Lar dos Idosos tem algum distúrbio psíquico ou deficiência mental e são dependentes, pois já não conseguem realizar atividades básicas sozinhos, como tomar banho e alimentar-se. Esse também é um fator que leva as famílias a deixá-los entregues aos cuidados de pessoas mais especializadas, por não saberem lidar com essa situação.
A funcionária Maria Helena Três trabalha há muitos anos no asilo, muito dedicada e carinhosa com os velhinhos, sabe contar a história de cada um deles. Conforme Maria Helena, o dia-a dia no Lar dos Idosos é tranqüilo. Pela manhã, eles se reúnem para tomar café no refeitório, exceto aqueles doentes que precisam de cuidados especiais. Muitos vivem em cadeira de rodas, e alguns já não conseguem sair da cama.

A ilusão
A maioria deles foi levado até o asilo pelos familiares, inclusive pelos próprios filhos. Há casos em que eles são enganados pela família, que diz que os mesmos vão fazer um tratamento por um determinado período de tempo e que assim que ficarem restabelecidos voltarão pra casa. Entretanto, o tempo passa e eles vão ficando, cinco, dez, vinte anos, até o fim de suas vidas.
Conforme Elza Maria Rodrigues, enfermeira, funcionária do Asilo, são diversos motivos que levam os idosos até ali. Alguns chegam ali doentes, com problemas mentais, ‘’eles trabalharam uma vida inteira, e quando ficam mais velhos, doentes, usando fraldas, e já não conseguem mais desenvolver as atividades diárias, como se alimentar e tomar banho sozinhos, a família procura uma forma de interná-los, até pela falta de tempo e de tato para lidar com essa situação’’. Afirma Elza. Muitos chegam no asilo com seqüelas de AVC, diabetes, hipertensão, entre outros. No Lar dos Idosos eles têm cuidados médicos que funciona diariamente.

A tranqüilidade
Alguns souberam enfrentar a realidade e ver nela um aspecto positivo. É o caso de Dona Ambrosina Mello, 69 anos, natural de Frederico Westphalen, que vive no asilo há 10 anos. O motivo que a levou ela a chegar até o asilo é bastante triste, ela conta que tinha uma filha que sofria de depressão e acabou se suicidando. Dona Ambrosina ficou doente, foi internada e nunca mais quis voltar pra casa onde morava, pra não relembrar a filha. Segundo ela, a casa foi fechada como estava e ela nunca mais voltou lá. 
 Ambrosina faz questão de mostrar o seu quarto, as cortinas cor-de-rosa, a cama com colchas da mesma cor, vários porta – retrato dos filhos encima da cômoda. Numa gaveta ela guarda mais fotos de toda a família que faz questão de mostrar. Conforme Dona Ambrosina, a família a visita com freqüência e ela sai dali sempre que pode pra passear e visitar os parentes. No Lar dos Idosos, ela encontrou um segundo lar. Ela diz que se sente bem e que tem uma vida calma e sossegada.
Amália Balzan tem 71 anos e nasceu em Faxinal do Soturno, antes de vir pro asilo, residia em Castelinho, onde morava com a filha e o genro. Porém, depois que seu marido faleceu, ela entrou em depressão e por decisão dela e apoiada pela família, decidiu ficar um tempo se tratando no Lar dos Idosos. No entanto, passado algum tempo, ela acabou se adaptando e gostando do local. Hoje, faz 03 anos que ela reside no asilo e diz que se sente bem e que por enquanto não pretende voltar pra sua casa.A família a visita com freqüência, ela também vai visitá-los e passa alguns dias com eles, viaja também para o estado do Mato Grosso, onde dois de seus filhos residem.


Danilo Mazonetto é feliz no Asilo./ Foto: Marciane Hences.
 A falta de alternativas
Outra história que chama a atenção é de um Senhor bastante jovem que vive no Lar dos Idosos. Danilo Mazonetto tem 55 anos de idade, nasceu em Caiçara e vive no asilo há um ano e meio, ele é portador de necessidades especiais, de uma família de quatorze irmãos, onde oito nasceram com alguma deficiência física. Ele conta que morava com a família e muito jovem ainda, perdeu o pai, passou por diversos problemas devido a sua dificuldade em conseguir um trabalho. Morou algum tempo com uma irmã e depois foi para a Associação dos Deficientes Físicos (ADF) onde viveu por 20 anos e dali veio para o asilo.
No quarto de seu Danilo, é tudo limpo e organizado, uma TV, um rádio digital e alguns livros lhe fazem companhia. Ele diz que é feliz no Asilo, que os funcionários são bons e que o tratam muito bem. ’’Jamais vi uma instituição tão perfeita, os funcionários são muito humanos e tudo é feito pelo bem das pessoas que moram aqui’’. Conclui Mazoneetto.
Poucos tiveram acesso à escolaridade, e exerciam profissão de domésticas, donas de casa, pedreiros e muitos vêm do campo, onde trabalhavam como agricultores. Antes de vir pro asilo, alguns eram maltratados pelos filhos ou familiares. Há casos também em que a pessoa era sozinha, sem família ou parentes próximos e então é encaminhada até ali pela Assistência Social. Em outras situações, por Ordem Judicial, como é o caso de uma senhora que sofria maus tratos em sua própria casa.
Para os cidadãos de baixa renda, estar em um asilo pode significar ter acesso a atendimento médico e a outros cuidados com a saúde que eles não conseguiriam do lado de fora. Há os que foram parar lá por decisão arbitrária da família. Outros que escolheram viver em asilo por achar que teriam mais liberdade do que na casa de parentes ou por se considerarem um peso para os filhos. Portanto, o asilo não é sinônimo apenas de abandono, mas também de proteção.

Conforme a enfermeira da instituição, Elza, qualquer contribuição é bem vinda. Quem quiser ajudar a Instituição pode colaborar com roupas, alimentos, material de limpeza, e até mesmo indo visitar os idosos, que com certeza, ficarão feliz em receber o carinho e apoio da sociedade.


Selaria Sanvido, pra você não cair do cavalo

Selas, arreios, pelegos, rédeas, cuias, tudo que acompanha o cavaleiro, pode ser encontrado na selaria de Lomir Sanvido

Ainda é cedo quando chego na propriedade onde o Sr Lomir Sanvido confecciona manualmente selas para cavalo, no interior de Frederico Westphalen. Ele não se intimida com minha presença, nem com os flashs da câmera, e continua seu trabalho tranqüilamente, ora riscando o couro, ora recortando-o ou costurando as peças soltas que irão compor as selas.
Lomir Sanvido tem 54 anos de idade e é natural da cidade de Irai, onde começou a trabalhar nesse ofício, por volta do ano de 1988. Ele diz que sempre gostou de cavalos, o que é perceptível em suas vestimentas, típicas de um gaúcho. Ia muito a rodeios de tiros de laço, chegando até a montar algumas vezes.Na época, trabalhava na prefeitura de Iraí, mas não se sentia satisfeito com seu trabalho. Foi então que Lomir passou a ver no ofício de confeccionar selas de montaria para cavalos, um meio de vida.

O início da profissão
Lomir Sanvido iniciou fazendo algumas selas, que vendia entre os amigos e conhecidos. Porém, o negócio prosperou tanto que ele resolveu registrar a empresa que nascia. De pequeno porte, chegou a ter oito funcionários, além dele e da esposa, Olga Sanvido, que também trabalhava na empresa.
A “Selaria Sanvido’’ia de vento em popa. Lomir e a esposa vendiam selas para diversas cidades no Estado do Rio Grande do Sul, também para o Paraná, Mato Grosso e Santa Catarina. “Na cidade de Dionísio Cerqueira, tínhamos exclusividade com um atacado”, explica Sanvido.
Entretanto, depois de alguns anos, as vendas passaram a cair, e Lomir passou a sentir na pele a desvalorização da sua profissão. “As selas feitas manualmente levam mais tempo para ficar pronta, e geralmente são confeccionadas com couro legítimo, o que encarece o produto e leva o consumidor a procurar aquelas produzidas industrialmente. Entretanto, a sela feita de forma manual, possui maior qualidade e leva muitos anos para se desintegrar”, explica Sanvido.
Não obstante a diminuição das vendas, uma fatalidade do destino viria antecipar as sombrias previsões do Seu Lomir.Por volta de 1994, um cliente de Ijuí encomendou diversos produtos, a entrega foi realizada na data marcada, porém o pagamento da mercadoria não foi efetuado. O prejuízo foi muito grande, a empresa precisou usar as economias guardadas durante anos, e apesar dos esforços de todos, a Selaria Sanvido decretou falência.
No ano de 2001, Lomir, a esposa e o filho se mudam para Frederico Westphalen, indo residir no bairro Fátima. Irai já não inspirava futuro e aqui eles sonham retomar e dar um novo rumo ao negócio.

Como é feito o trabalho
As selas são feitas de couro, e possuem diversas peças que juntas, irão compor uma sela: basto, bacheiro ou chergão, carona, serigote ou sela, loros ou estribos, chincha com barrigueiro, pelego, sobrechincho, rédea com cabeçada, bucal com cabresto, peiteira, freio.
Ele vende atualmente para lojas de São Miguel do Oeste, Chapecó, Iporã do Oeste, Erechim, Passo Fundo, Soledade, Casca e principalmente, Alegrete, na região da campanha. As selas são feitas por encomenda e Seu Lomir mesmo faz as entregas nas cidades onde foi feito o pedido. Além das lojas, os pedidos são feitos por pessoas que usam as selas para rodeios, em torneios de laço, o que exige montarias mais reforçadas. Há também aqueles que utilizam o cavalo para a lida no campo, e que necessita de montaria. Além disso, Lomir também faz reformas de selas.
Depois de prontas, as selas custam em torno de R$ 400 e podem variar até R$ 600, dependendo do que o cliente pedir. Todas são feitas manualmente. A única máquina utilizada é a de coser tecido. As selas levam de dois a três dias para ficar pronta.

A desvalorização do trabalho manual
Hoje, a profissão de Lomir não é tão valorizada quanto deveria. “Eu prezo pela qualidade dos serviços que presto aos consumidores, procuro oferecer um produto de excelente qualidade”, explica Sanvido. Segundo ele, alguns compradores consideram os produtos caros, e por isso preferem comprar selas prontas, feitas de outro material. Algumas são feitas com borracha, são mais fáceis de fazer e por isso levam menos tempo para ficar pronta. O material utilizado também é mais barato, tudo isso acarreta num valor menor do produto. Em compensação, duram bem menos que as confeccionadas por Seu Lomir.
Quando pergunto ao Seu Lomir qual a sua opinião sobre as mudanças ocorridas na sociedade, em que a indústria substituiu o trabalho manual do homem ele me diz que ele pertence a uma época em que se prezava pelo valor real das coisas, onde um produto durava uma “vida inteira” e quando se adquiria algo se sabia que era de qualidade. Não era como hoje, num mundo consumista, onde as coisas são descartáveis, se compra, se utiliza e logo se joga fora. Por outro lado, ele confessa que não soube acompanhar as mudanças ocorridas no sistema de produção capitalista, por isso precisou fechar sua empresa, demitir os funcionários e se mudar para Frederico Westphalen.
O número de seleiros reduziu bastante nos últimos anos. Porém, ainda existe grande procura por parte das pessoas que utilizam cavalos nas carroças, tração animal, em rodeios, ou simplesmente cavalgam por esporte.
Selas, arreios, pelegos, rédeas, cuias, tudo que acompanha o cavaleiro pode ser encontrado na selaria de seu Lomir. O trabalho artesanal é feito com muito cuidado e exige anos de aprendizagem.Tudo é feito à mão e com couro legítimo. Nesses vinte anos de profissão, Lomir Sanvido se orgulha de fazer um trabalho que preza pela qualidade e satisfação do cliente.



Alfaiataria, uma profissão que resiste ao tempo

O talento, aliado ao trabalho, são os responsáveis pelo sucesso de Irineu Theisen, que trabalha há 30 anos como alfaiate


Foto: Marciane Hences

Irineu Theisen nasceu no ano de 1955 e trabalha como alfaiate há trinta anos, mantendo viva uma das profissões mais antigas do mundo. Aluga uma loja no centro da cidade de Frederico Westphalen, onde confecciona ternos masculinos. A atividade foi herdada do pai, que tinha uma alfaiataria na cidade de Pinheirinho do Vale. A família se mudou pra cá por volta dos anos 80, com o objetivo de expandir as vendas, pois já possuíam aqui uma vasta freguesia.
Enquanto o pai trabalhava, Irineu, ainda menino, ficava observando-o, e assim foi tomando gosto pelo ofício. Aos poucos, o pai foi lhe ensinando a fazer os primeiros cortes no tecido, que iam tomando formas. Começavam aí os contornos de sua futura profissão.
Seu Irineu diz que ama o trabalho que faz e nunca pensou em mudar de área. A profissão, passada de pai para filho, é realizada com obstinação por ele. Quando há muitas encomendas, fica na loja mais de doze horas por dia, e até nos sábados.
Ele trabalha com moda masculina, para adultos, mas são os ternos que alavancam o negócio. Ele também confecciona bombachas, coletes, e faz algumas reformas, mas somente para clientes já conhecidos, “isso atrasa o restante das confecções”, explica Irineu. Na época de inverno, muitas pessoas encomendam sobretudos, o que aumenta muito as vendas.

Como é feito o trabalho
O cliente vem até a loja, escolhe a cor, o tecido, tira as medidas, paga adiantado 50% do valor e então fica acertado o dia da entrega, quando será pago o restante. “Eu insisto para que o interessado venha até a loja e prove o terno depois de pronto, então, se for necessário algum ajuste, já faço antes da entrega, para que o cliente saia satisfeito”, afirma Irineu.
A clientela da alfaiataria se mantém fiel há anos. Alguns se mudaram para outras cidades, como Chapecó e Passo Fundo. “Tenho até um cliente de Jataí, estado de Goiás. Eles encomendam os ternos por telefone. O valor cobrado é depositado na minha conta e as roupas, depois de prontas, são enviados pelo correio”, explica Irineu.
Os ternos, depois de prontos, custam em torno de R$ 300 à R$ 400.Os tecidos são encomendados de São Paulo. Os mais usados são tergal, viscose e poliéster. Os ternos pretos são os mais vendidos, pois “o preto nunca sai de moda”, afirma Irineu.
Pacientemente, ele risca o tecido com pedaços de giz, recorta, alinhava, passa a ferro as pecas soltas. E os primeiros vestígios de um terno vão se formando em cima da mesa. Por fim, costura as peças soltas, numa máquina modelo Singer, acomodada a um canto da sala. Incansável, ele passa o dia todo labutando. Sem funcionários, faz todo o trabalho sozinho. Se há muitos pedidos acumulados, leva algumas peças para casa e não descansa enquanto não faz as entregas, sempre na data marcada.

A substituição do trabalho manual pelas máquinas
A alfaiataria de Irineu Theisen resistiu à Revolução Industrial. Atualmente, as alfaiatarias cederam espaço para as lojas de tecido, que produzem em grande escala, de forma padronizada. Os tecidos usados são de toda espécie, dos mais comuns aos mais rebuscados e as marcas variam de acordo com a possibilidade de compra dos consumidores. A pressa na produção também é mais um fator que ajudou a suplantar toda uma geração de alfaiates.
Mas a história de Irineu Theisen não tem um final triste, pelo contrário, é uma história de sucesso. Irineu conta que já recebeu diversos convites para confeccionar ternos em outros estabelecimentos, inclusive nas Lojas Tevah, em Porto Alegre. Entretanto, ele recusou, já que gosta de fazer seus horários, o que lhe proporciona uma certa independência, por isso prefere ter seu próprio negócio.
Portanto, apesar do avanço tecnológico e do surgimento de novas atividades no mercado de trabalho, algumas resistem ao tempo. Irineu conseguiu sobreviver à influência massificante da indústria da moda. O talento, aliado a uma rotina pesada de trabalho são os responsáveis por seu sucesso.
Irineu Theisen têm uma ampla freguesia. Quanto à fórmula para o sucesso, ele responde “as pessoas preferem pagar um pouco mais e ter uma roupa personalizada”. E com relação à propaganda? Ele afirma que em todos esses anos de profissão, nunca colocou anúncio em qualquer veículo de comunicação. “A propaganda é o próprio cliente que faz”, finaliza o alfaiate.


Apesar do avanço tecnológico e do surgimento de novas atividades no mercado de trabalho, algumas resistem ao tempo.

Moinho Vicato, o guardião do tempo

Erguidos no início do século passado, os moinhos coloniais simbolizavam o modo de vida dos colonos italianos


O Moinho Vicato fica no centro de Frederico Westphalen e passou por todo o processo de desenvolvimento da mesma, desde que era apenas uma pequena vila de moradores. A casa de alvenaria foi construída por volta de 1930 e resiste ao tempo, conservando intacta uma parte da história da cidade.
Paulo Krzyaniak, com 74 anos de idade é quem zela por esse patrimônio. O Moinho foi adquirido pela família no ano de 1944. Os antigos proprietários, José Ferrari e José Scapin, migrantes de Nova Palma, compraram-na da Cooperativa Vitória. A partir daí, Adão Krzyaniak e os três filhos, Pedro, Vicente e Paulo passaram a se dedicar exclusivamente ao moinho.
Erguidos no início do século passado, os moinhos coloniais simbolizavam o modo de vida dos colonos italianos. Os agricultores levavam sacos de grãos de trigo e milho e voltavam para casa com a farinha. O moinho abastecia toda a região. Após a colheita, agricultores das cidades mais próximas de Frederico Westphalen, como Rodeio Bonito, Vicente Dutra, Irai, Taquarucú do Sul, entre outras, traziam os grãos no moinho para serem moídos.

Negócio de família
Toda a família ajudava na manutenção do moinho, já que uma pessoa sozinha não era capaz de fazer funcionar o moinho. Os livros-caixa, guardados com todo o cuidado no escritório de Seu Paulo trazem o registro dos funcionários da época, inclusive ele e os dois irmãos. Cada um tinha uma atividade e recebia um salário para desempenhá-la.
Paulo era ajudante de foguista, tarefa árdua que consistia em passar o dia alimentando uma caldeira com fogo, espécie de locomotiva que gerava energia para tocar as máquinas. A lenha usada para manter essa produção vinha da colônia e era puxada com carroça. Os irmãos e os funcionários se revezavam nesse trabalho. Nessa época ainda não havia ocorrido a mecanização das lavouras, portanto, havia muito mato no interior.
No ano de 1965, a família instalou equipamentos movidos à energia elétrica. A máquina de moer trigo veio da Inglaterra. Há também uma para fazer farinha de milho e outra que descasca arroz, que vieram de São Paulo. Hoje, todas estas máquinas estão desativadas.
As máquinas são acionadas num painel de controle. O grão passa por um processo, primeiro ele é separado da casca, em seguida, passa por um triturador, que vai moê-lo até transformá-lo em farinha e depois pra última etapa, onde é peneirado, separando as impurezas. A farinha que não era vendida ia para grandes baús de madeira, onde ficava armazenada. Posteriormente, ela seria comercializada em sacos ou bolsas de estopa, que as pessoas traziam de casa. Muitas vezes, os agricultores traziam o trigo ou o milho, em grãos, e trocava pela farinha, já pronta.

Paulo Kryzaniak, uma vida dedicada ao trabalho
O Moinho Vicato possui dois andares e um subsolo, onde está a nascente do Rio Pedras Brancas. Ela é responsável pelo abastecimento da produção desde que ele foi fundado, há mais ou menos 80 anos.
Dentro do moinho, o cheiro de farinha misturado ao odor das madeiras antigas nos remete às lembranças de um passado longínquo, num tempo em que tudo era muito diferente. As famílias eram numerosas, as relações de produção eram outras, o pão e a polenta eram a base alimentar das mesmas, compostas principalmente por imigrantes italianos e alemães.
Com quase oitenta anos de história, muita coisa mudou desde a fundação do moinho. As relações de produção não são as mesmas. Os produtos artesanais foram substituídos pelos industrializados, produzidos em grande quantidade. São poucos os agricultores que ainda trazem seus grãos para serem moídos. A maioria prefere comprar a farinha pronta, nos mercados. Seu Paulo ainda vende arroz, ração para trato de animais, farelo de trigo e concentrado.
Vicente e Pedro faleceram há alguns anos e de lá pra cá, Seu Paulo tem cuidado sozinho do negócio. Mesmo estando aposentado, ele mantém uma rotina de trabalho diária. Acorda cedo todos os dias e pontualmente, às 8 horas da manhã, o moinho é aberto aos clientes. Funciona de segunda a sexta e nos sábados, até o meio dia. Não possui funcionários e apesar da idade, ele diz que não pretende parar de trabalhar, que se sente bem no local onde esteve durante toda a sua vida.
Paulo Krzyaniak guarda com muito carinho um conjunto de preciosidades raras, que perduram ao longo das gerações. Os moinhos provavelmente deixarão de existir com o passar dos anos, mas continuarão vivos na memória das pessoas que assim como ele sabem valorizar a cultura de um tempo que já se foi.


Agradecço ao Sr. Paulo Kryzaniak, Irineu Theisen e Lomir Sanvido por terem partilhado seus conhecimentos e pela atenção dedicada. Obrigada!